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Tocilizumabe, um promissor candidato no combate ao SARS-CoV-2?

Por Juliana Givisiéz Valente


O medicamento tocilizumabe é um anticorpo monoclonal recombinante humano específico para o receptor de interleucina-6 (IL-6). A IL-6 é uma citocina pró-inflamatória que pode ser encontrada em quantidades anormais em pacientes infectados com o vírus SARS-CoV-2, e neste quadro, podendo desencadear a Síndrome de Tempestade de Citocinas (STC). Alguns estudos apontam que a STC está associada com os desfechos fatais da COVID-19. A STC caracteriza-se como uma síndrome inflamatória sistêmica aguda e pode acarretar em febre e falência múltipla de órgãos. O tocilizumabe é um potente candidato ao combate da STC e aos sintomas pulmonares em pacientes com a COVID-19 gravemente enfermos. No entanto, os resultados de ensaios clínicos randomizados que avaliaram a eficácia de tocilizumabe no tratamento de pacientes com a COVID-19 são conflitantes e ainda não há uma orientação definitiva sobre o uso deste medicamento.

Um estudo clínico randomizado, multicêntrico, aberto, realizado em Paris, na França, avaliou o uso de tocilizumabe em pacientes internados em hospitais. Entre estes, 64 de 131 adultos com pneumonia associada a quadro moderado ou grave da COVID-19, sem necessidade de cuidados intensivos foram randomizados para receber 8 mg/kg de tocilizumabe (1–2 doses) junto com o cuidado padrão e 67 pacientes foram randomizados para receber apenas o cuidado padrão.O tocilizumabe não reduziu a pontuação da escala de progressão clínica de 10 pontos da Organização Mundial da Saúde para um valor menor que 5 até o 28º dia do estudo.


Um estudo clínico de fase 3 controlado, randomizado, duplo-cego e realizado pelo fabricante (Roche) avaliou a segurança e eficácia do tocilizumabe associado com o cuidado padrão em comparação com o grupo controle, que recebeu apenas o cuidado padrão, em adultos hospitalizados com a COVID-19 grave que também apresentavam pneumonia. O estudo não demonstrou melhora do estado clínico até a semana 4 (determinado usando um parâmetro de escala de 7 pontos para avaliar o estado clínico com base na necessidade para cuidados intensivos e/ou uso de ventilador e necessidade de oxigênio suplementar) e não houve redução da mortalidade dos pacientes entre aqueles que receberam tocilizumabe.


Um estudo clínico, randomizado, duplo cego incluiu 243 adultos com a COVID-19 grave com quadro clínico hiper inflamatório e pelo menos 2 dos seguintes

sinais: febre, infiltrados pulmonares ou necessidade de oxigênio suplementar. Os participantes foram atribuídos aleatoriamente em uma proporção de 2:1 para receber cuidados padrão associado com uma única dose IV de tocilizumabe (8 mg/kg) ou receber apenas o cuidado padrão. Os pacientes que receberam tocilizumabe tiveram quadro de febre menos grave do que os pacientes que receberam apenas o cuidado padrão. No entanto, o tocilizumabe não foi eficaz na prevenção da intubação ou da morte em pacientes hospitalizados moderadamente enfermos.


Um estudo internacional multicêntrico aberto, ainda em andamento, e não revisado por pares (NCT02735707; REMAP-CAP) randomizou pacientes para múltiplos domínios de intervenção. Entre estes, 353 pacientes receberam 8 mg/kg por via intravenosa de tocilizumabe, a dose poderia ser repetida 12-24 horas depois, enquanto 402 pacientes do grupo controle receberam corticosteroides como tratamento padrão. Houve uma diminuição da mortalidade entre pacientes que receberam tocilizumabe (a mortalidade foi de 22% para tocilizumabe versus 36% para o grupo controle). Também foi observado uma melhora na sobrevida e aumento do número de dias sem suporte aos órgãos entre aqueles que receberam tocilizumabe.


Um estudo randomizado, controlado, aberto (NCT04381936; RECOVERY) está avaliando possíveis tratamentos em pacientes hospitalizados com a COVID-19 em hospitais do Reino Unido. O estudo foi conduzido com um grupo controle de 2.094 pacientes adultos randomizados para receber apenas o cuidado padrão e 2.022 pacientes adultos que receberam o tocilizumabe por infusão IV (400-800 mg, com base no peso; uma segunda dose poderia ser administrada dentro de 12-24 horas). No momento da randomização, 82% dos pacientes estavam recebendo corticosteroides. O desfecho primário foi a mortalidade no 28º dia. Os resultados preliminares, ainda não revisados por pares, foram que 596 pacientes (29%) no grupo tocilizumabe morreram dentro de 28 dias em comparação com 694 pacientes (33%) no grupo controle. Os pacientes que receberam corticosteroides e tocilizumabe concomitantemente mostraram um benefício na redução da mortalidade. Pacientes que receberam apenas tocilizumabe também eram mais propensos a alta hospitalar dentro de 28 dias em comparação com aqueles que receberam apenas o cuidado padrão (54% versus 47%, respectivamente). Esses benefícios foram vistos em todos os subgrupos de pacientes. Entre pacientes que não estavam recebendo ventilação mecânica invasiva no início do estudo, o tocilizumabe foi associado com um risco substancialmente menor de progredir para ventilação mecânica invasiva ou morte em comparação com o grupo controle (38 versus 33%, respectivamente). Porém, não há evidências de que o tocilizumabe tenha qualquer efeito sobre a chance de cessação bem sucedida da ventilação mecânica invasiva.


O Painel de Diretrizes da National Institute of Health (NIH) revisou as recomendações em relação ao uso do tocilizumabe em pacientes com a COVID-19 com base nos resultados do estudo REMAP-CAP e outros ensaios para pacientes nas primeiras 24 horas da admissão em UTI e que requerem ventilação mecânica invasiva ou não invasiva ou alta fluxo de oxigênio (> 0,4 FiO2/30L/min de fluxo de oxigênio). A NIH afirma que os dados, até o momento, são insuficientes para uma recomendação definitiva a favor ou contra o uso de tocilizumabe para o tratamento da COVID-19. No entanto, a NIH apresentou o seguinte considerações:


1) Tendo em vista os resultados do estudo REMAP-CAP, a NIH recomenda a

administração de uma dose única de tocilizumabe (8 mg / kg de peso corporal,

até 800 mg), além de dexametasona para pacientes que atendem aos critérios acima e que também estão exibindo rápida progressão na dificuldade de respiração.


2) Em pacientes que não requerem cuidados ao nível de UTI ou são admitidos na UTI mas não atendem aos critérios acima, a NIH não recomenda o uso de tocilizumabe para o tratamento da COVID-19, exceto em estudos clínicos.


Esse informativo foi elaborado com base na atualização do dia 11 de março de 2021 da Assessment of Evidence for COVID-19 - Related Treatments. Como ainda há estudos em andamento sobre o uso de tocilizumabe em pacientes com a COVID-19, é importante continuar acompanhando as atualizações sobre as recomendações de uso do medicamento. A Assessment of Evidence for COVID-19 - Related Treatments está disponível no link abaixo:


Referências


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15. U.S. National Library of Medicine. ClinicalTrials.gov. Accessed 2020 Jun 22. Available from https://clinicaltrials.gov/ct2/show/study/NCT04331808. NLM identifier: NCT04331808.


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